"Family is not an important thing. It's everything."
Michael J. Fox
Quinze de maio. Dia Internacional da Família.
Pediram-me para fazer um texto sobre a família para a escola! diz Artur (nome fictício). E estás a perguntar-me isso porquê? questiona Ana (nome fictício), mãe do Artur. Porque tu és a mãe! responde-lhe este imediatamente. E então? pergunta Carlos (nome fictício) o pai do Artur e namorado da Ana. Porque é que não tiras uma foto? grita António (nome fictício), meio irmão do Artur, filho da Ana do seu primeiro casamento. Enquanto tudo isso a situação lá em casa começa a ficar cada vez mais tensa com a correria do Duarte (nome fictício), filho mais novo da Ana e do Carlos. Alguém sabe o que vai ser o jantar? perguntava Carolina (nome fictício), filha adoptiva da Ana no seu primeiro casamento, enquanto cortava a terceira fatia de bolo de chocolate que estava em cima da mesa. Bolo de chocolate esse que ninguém fazia a ideia de quem o tinha trazido, mas o Carlos tinha deixado em cima da mesa mas esqueceu-se de avisar que era para o aniversário do António.
No outro dia ouvi na televisão uma pessoa falar sobre famílias imperfeitas e fiquei a pensar que devia perguntar à mãe sobre o texto da família para a escola! voltou Artur à carga. Ana e Carlos deram uma gargalhada. A Carlina e o António ficaram boquiabertos com o Carlos que nunca lhe tinham visto um esboço de sorriso na cara, ou algo perto disso, excepto os tiques faciais que já lhe são habituais.
Não fiquem à espera que o texto tenha um final feliz e bonito. Não é assim que acontece na realidade das famílias. E isso não quer dizer que não seja fantástico, não seja tudo, tal qual a frase do Michael J. Fox. É como a foto que acompanha o texto. É uma foto de família. É uma foto de uma família a ser família e não a tentar ser família e muito menos a tentar ser família para os outros.
A Ana, o Carlos, o Artur, o António, a Carolina e o Duarte são uma família. Ainda que o Artur já tenha dito que uma família é aqueles que se escolhe e ele não tem a certeza se o António e a Carolina o escolheram. Todos eles têm um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo (PEA). Até mesmo a Carolina que foi adoptada. A Ana diz que não fazia a mínima ideia de que a Carolina seria do espectro do autismo quando a adoptaram. Mas o certo é que ao fim de algum tempo perceberam que ela era demasiado parecida à família e quando foram pedir para ser avaliada verificaram que o era. Deram todos uma gargalhada no gabinete médico. Todos menos o Carlos. até porque nessa altura ainda não sabia se era do espectro ou não e só foi ver dessa questão do diagnóstico quando a Carolina lhe disse uma vez ao jantar - Se eu sou do espectro então tu és do infinito!
O Artur acabou por não levar o texto sobre a família para a escola. Ele fez o texto, mas como também tem Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção acabou por não o levar. Acabou por sobrar uma fatia do bolo de chocolate. A Carolina já não conseguia comer mais, ainda que tenha algumas questão com a compulsão alimentar. O António também não se importou. Eu nunca gostei dessa ideia de celebrar os anos! disse. O Carlos é que parece que anda diferente desde que começou a terapia e agora anda a fazer umas coisas estranhas! acrescentou. Ainda assim cantaram os parabéns. Fizeram-no num tom muito baixo, até porque a hipersensibilidade auditiva da Ana não permite muito mais.
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