Em Portugal os filhos saem de casa dos pais entre os 27 e os 29 anos de idade, com ligeiras diferenças entre raparigas e rapazes. Alguns dos que estão a ler o texto poderão ter experiências diferentes consoante as suas idades. Mas independentemente das diferenças existentes dentro e comparativamente as diferentes gerações, uma coisa é comum em todos - a importância de na entrada da vida adulta haver um sinal mais claro de autonomia e independência.
Seja porque estão a fazer um percurso na formação ao nível do Ensino Superior ou pós-graduada, mas também porque já estão no mercado de trabalho. Os jovens adultos e os seus pais procuram criar condições para que seja possível alcançar essa fase da vida e ter alguma base mais sólida que lhes permita continuar a sua vida de forma mais autónoma e independente.
Este percurso de entrar na vida adulta, habitualmente designado mais recentemente de adultez, e que se tem vindo a alterar em termos de intervalos de idades nos últimos anos, é marcado por vários outros acontecimentos de vida, alguns deles mais desafiantes que outros. Nomeadamente, algumas destas pessoas, e numa percentagem cada vez maior de acordo com os estudos publicados, têm uma maior probabilidade de vir a ter uma perturbação de ansiedade ou depressão. Ainda que sejam situações que quando tratadas, a pessoa consegue adaptar-se e ter estratégias para lidar com as situações mais adversas e continuar o seu projecto de vida. Contudo, há outras pessoas que apresentam outras condições para além de ansiedade ou depressão, podendo ser situações que acompanham a pessoa ao longo do seu ciclo de vida, como é o caso da Perturbação do Espectro do Autismo. Contudo, sejam estes jovens adultos autistas, mas também os seus pais, desejam a mesma coisa que todos os demais - poder alcançar uma maior autonomia e independência na vida, mas também uma melhor qualidade de vida.
Contudo, muito da investigação que se faz sobre o autismo no adulto continua demasiadamente centrado nos aspectos da identificação e diagnóstico, assim como das características comportamentais pertencentes ao diagnóstico e das demais comorbilidades, etc. E são todas elas questões fundamentais a investigar. Mas não podem ser as únicas. Porque continuamos a desconhecer muito sobre a forma como as pessoas autistas adultas estão a viver as suas vidas. E as pessoas autistas precisam de saber mais e melhor o que esperar da sua vida adulta, assim como os seus pais. E por isso a questão continua a ser insistentemente colocada por uns e por outros.
Por exemplo, qual o nível de suporte que uns e outros precisam? E não respondam que isso se vê na DSM 5 (nível 1, 2 e 3). Na realidade qual o tipo e percentagem de suporte que cada uma das pessoas autistas adultas precisa? Em em que áreas? E porquê? E acontece porque os próprios não são capazes de o assegurar? Ou porque não foram ajudados a aprender a ser capazes de o fazer? Como podem ver as perguntas são muitas. E se pensamos que as pessoas com um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo nível 1 poderá necessitar de menos suporte e apoio que uma pessoa com um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo nível 2, como é que sabemos isso? Apenas porque está escrito na DSM 5? Ou porque temos a experiência desta ou daquela situação que acompanhamos enquanto profissionais ou familiares? E quanto ao resto das pessoas autistas adultas? É porque se não sabemos que tipo e percentagem de apoios as pessoas autistas estão a necessitar, como é que os podemos pensar e inclusive providenciar?
E qual o nível de bem estar e alegria? Sim, qual é o nível de bem estar e alegria sentida pelas pessoas autistas adultas? E não vale responder que as pessoas autistas não são capazes de sentir alegria! E se pensarmos que as terapias que estão a realizar são fundamentais para os ajudar a auto-regular, treinar em termos de competências sociais, ajudar a resolver problemas e tomar decisões, lidar com a disfunção executiva, etc. Então porque não sabemos qual o nível de bem estar e alegria das pessoas autistas adultas?
Ou qual o envolvimento das pessoas autistas adultas na comunidade? E não me estou apenas a referir à comunidade autista. Estou a pensar na comunidade como um todo, onde as pessoas residem, no país que as pessoas vivem, no Mundo de uma maneira global. Qual o envolvimento na cultura? E na politica? Nas organizações e associações? Escolas? Universidades? E não é apenas saber qual o envolvimento enquanto utilizadores. É também o envolvimento enquanto agentes transformadores e criadores!
E qual a sua situação em relação à habitação própria? E vida romântica? Ou terem filhos?
Para quem não sabe, 30 jardas equivale a cerca de 28 metros aproximadamente. Algo que para muitos de vocês pode parecer pouco ou pelo menos fazível. Mas se tiverem de fazer essa distância de forma continuada como em vai-e-vem, porventura já vão pensar duas vezes em dizer o mesmo. E se o tiverem de fazer em condições de maior cansaço ou constrangimento físico ou mental ainda menos.
As coisas não são assim tão bem como nos aparecem. E isso é verdade para si, mas também para qualquer um de nós, sejamos pessoas não autistas ou autistas. Contudo, para as pessoas autistas temos um grande desconhecimento sobre a sua realidade ainda que a consigamos pensar, equacionar, deduzir, etc. Mas é sempre uma aproximação. E com esta ideia tão relativa não se consegue propor medidas adequadas para a mudança da realidade das pessoas autistas adultas e ficamos todos sem saber o quanto eles e elas são capazes de correr uma e outra vez estas 30 jardas.
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