Todos sabem que a sopa da pedra leva uma pedra, certo? Mas se virem um tacho com pedras não precisam de começar a pensar em se sentar à mesa com vontade de almoçar, combinado? No autismo e mais especificamente nas terapias recomendadas também se passa algo semelhante. Há pedras e pedras...
Desde 1940 no surgimento dos trabalhos Kanner e Asperger que se propõem várias medidas de intervenção. Ao longo destes últimos anos a proliferação de modelos teóricos e paradigmas tem multiplicado as possibilidades e ajustado as intervenções cada vez mais à necessidade das pessoas. No site da NICE (National Institute for Health and Care Excelence) podem encontrar informação cientificamente validada acerca das terapias e intervenções a serem implementadas no autismo (ver link - https://www.nice.org.uk/guidance/conditions-and-diseases/mental-health-and-behavioural-conditions/autism).
É verdade que nem sempre os clínicos ou os investigadores comunicam da melhor maneira com o publico em geral. Faz-me lembrar quando tenho de ler um qualquer Decreto-Lei em "legislês". Neste caso aplica-se o "cientifiquês", as comorbilidades, disrupções comportamentais, desregulação emocional, maneirismos, estereotipias, rituais verbais, etc. É um sem fim de termos e nem sempre explicados ou bem explicados. O que por sua vez leva a que as pessoas procurem a informação. Contudo, esta procura é feita por um grupo de pessoas em particular - pais, na grande maioria angustiados e ansiosos. Porquê? Porque ou ainda não sabem do diagnóstico mas já começaram a suspeitar ou então alguém na escola referiu para estarem atentos. Ou então já foram a uma primeira consulta e receberam a informação do diagnóstico mas sem continuidade no apoio. Seja de que forma for a angustia e a ansiedade ainda irá continuar apesar do que se vai passar. E a procura de informação também.
As fake news e mais especificamente as fake news para a cura do autismo têm proliferado ao longo destes últimos anos. Tenha por base um comportamento deliberado para enganar as pessoas em troco de valores avultados nas terapias ou por simples ignorância e incapacidade de prever o impacto negativo nas pessoas autistas e nas suas famílias. O certo é que estas noticias vão surgindo em catadupa e nem todos os autistas e respectivas famílias estão protegidas ou a serem devidamente acompanhadas para poderem colocar estas questões.
São várias as vezes em que me é perguntado o que penso acerca da utilização de uma dieta livre de glúten para a melhoria do autismo ou outras situações semelhantes. Não é novidade a utilização de lixívia na cura do autismo. Talvez não com uma expressão tão grande em Portugal quanto em outros países mas ainda assim preocupante. Dietas, vitaminas, suplementos, etc., seja o que for não existe evidência da melhoria da qualidade de vida e da redução dos sintomas ou de determinados comportamentos mais desajustados.
Os pais sentem-se angustiados e na procura da melhoria da qualidade de vida dos seus filhos. Sentem-se desapoiados, desencorajados nesta ou naquela possibilidade de melhoria e quando ouvem alguém dizer que é possível reverter o autismo ou até mesmo curar não pensam muitas vezes em experimentar. "Não faz mal tentar!", pensarão alguns. Quem os poderá recriminar? É fundamental poder validar esta angustia, sofrimento e preocupação com o quotidiano dos seus filhos e reverte-la em respostas mais adaptativas na procura da melhoria e adaptação de certos comportamentos.
Mas não há cura para o autismo! Repito, não há cura para o autismo! Tal como a anterior imagem não é uma sopa da pedra. Por isso não tente experimentar em casa. Tal como não tente dar lixívia para curar o autismo!!
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