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Quem é que não ama o seu marido autista? (3ª parte)

Não há duas sem três, dizem. Na verdade, há muito mais do que isso. Assim como obervamos uma grande heterogeneidade no perfil de funcionamento da pessoa autista. Ainda maior é esta heterogeneidade quando a observamos numa diade de casal. Assim como a própria variabilidade ao longo do tempo, seja o da pessoa, mas também da própria relação.


Alguns aspectos que penso serem importantes voltar a sublinhar: 1) as pessoas autistas desejam ter relações interpessoais, sociais e românticas; 2) as pessoas autistas amam; 3) é importante procurar ajuda para ajudar a compreender o porquê das dificuldades nas relações pessoais, sociais e românticas continuarem a persistir apesar de já ter tentado várias coisas diferentes; 4) no caso de ter uma suspeita de estar no espectro do autismo ou da sua/seu companheira/o o suspeitar, será importante procurar um profissional de saúde especializado; 5) no caso de se verificar o diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo, é importante poder envolver a/o sua/seu companheira/o neste processo, nomeadamente para melhor compreender as suas características e de como melhor poder lidar com elas.


Muitas das questões que verificamos serem importantes poder intervir num casal (sendo que aqui não me estou a referir à terapia de casal, até porque isso é com a minha colega Dra. Teresa Carvalho), em que o marido tem um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo, é em muito semlhante e por vezes igual, ao que se intervêm em outros casais em que nenhum deles tem um diagnóstico. Por exemplo, aprender a usar estratégias de comunicação mais adaptadas e para ambos os membros do casal e não apenas para a pessoa autista. Uma comunicação óptima é importante em todas as relações. A comunicação social, é sabido como sendo uma das caracteristicas com compromisso na pessoa autista. A comunicação não verbal, como a interpretação de expressões faciais, gestos e entoação vocal, é muitas vezes extremamente difícil. A comunicação verbal pode ser difícil de iniciar para as pessoas autistas. Estas dificuldades devem-se a uma diferença na neurologia e não a uma falta de motivação.


É útil para o seu parceiro se a sua comunicação for clara, calma e previsível. A pessoa autista quererá normalmente satisfazer as necessidades do seu parceiro quando compreender como satisfazer essas necessidades. É importante comunicar explicitamente as suas necessidades sociais, emocionais, mentais e físicas, incluindo as sexuais. Em conjunto, os parceiros devem discutir informações sobre as expectativas comportamentais. Pense em termos de explicação em vez de correção. Diga ao seu parceiro as suas expectativas e peça-lhe que lhe diga as dele.


Muitas vezes, é necessário dar instruções muito explícitas e concretas que o seu parceiro possa seguir. Por exemplo, se precisar que o seu companheiro o ajude numa tarefa como lavar a roupa, dê instruções passo a passo sobre o quê, quando e como a roupa deve ser lavada. Se o seu companheiro não conseguir perceber o que deve lavar, talvez seja necessário um sistema de preparação de cestos de roupa suja. Por exemplo, podem ser utilizados cestos circulares para a roupa suja e cestos quadrados para a roupa limpa.


Pode ser necessário dar ao seu companheiro autista informação explícita e prática sobre como dar abraços. Pode parecer que o seu parceiro não quer ser afetuoso consigo, mas lembre-se de não julgar as acções e necessidades dele através da sua lente sem espetro. É importante abordar em pormenor todas as áreas de necessidade. Comunicar de forma muito literal e concreta será importante para muitos aspectos da vida. Alguns casais consideram que as mensagens de texto, os e-mails e/ou as informações escritas em papel, notas adesivas, calendários ou quadros de apagar são muito vantajosos.


Pense em marcar uma hora por dia para ambos se sentarem e comunicarem. Sentar-se lado a lado pode funcionar melhor para a comunicação. As pessoas autistas dizem quase universalmente que é difícil processar informação verbal mantendo o contacto visual. Isto é especialmente verdade quando estão a discutir as necessidades um do outro. Este tempo em conjunto pode contribuir muito para tornar a vida mais satisfatória e manter forte a vossa ligação como casal.


Mais uma vez, considere a possibilidade de utilizar informações visuais (notas, correio eletrónico, um quadro branco, até mesmo exemplos de livros ou outros meios visuais) para transmitir ou complementar as mensagens verbais. Seja criativo! A informação visual é muito mais fácil de processar para a maioria das pessoas autistas e pode ser utilizada como um recurso permanente quando a ansiedade, a sobrecarga sensorial ou as competências de funcionamento executivo estão a causar desafios aos vossos companheiros.


Perceba que pode não compreender a perspetiva do seu parceiro. Procure esclarecer. Reconheça que o seu parceiro pode ter dificuldade em pedir (iniciar) esclarecimentos e/ou mesmo saber que é necessário um esclarecimento. Os parceiros não autistas não podem interpretar o comportamento da Perturbação do Espectro do Autismo através do seu filtro sem espetro e assumir que compreendem o significado de um determinado comportamento do seu parceiro autista. Da mesma forma, o parceiro autista pode ter dificuldade em compreender as suas próprias necessidades. Cada parceiro deve identificar as suas necessidades e dizê-lo ao seu parceiro. Pode não parecer genuíno se tiver de dizer ao seu parceiro todos os passos para satisfazer as suas necessidades. Embora possa ser difícil no início, não pense que isso significa que o seu parceiro não se importa. Pense nisso como um passo importante para se apreciarem, confiarem e respeitarem melhor um ao outro.


Encontrar locais para descontrair (em conjunto e individualmente). É provável que você e o seu parceiro tenham formas diferentes de aliviar o stress. Toda a gente é diferente e tem formas diferentes de relaxar. Sendo um casal neurodiverso, pode haver mais diferenças que, no início, vos desafiarão a ambos. É importante que ambos aprendam as vossas formas pessoais de aliviar o stress e que expressem essas necessidades um ao outro. Os parceiros devem também respeitar as necessidades e os meios de cada um para se libertarem da tensão e da ansiedade. Por vezes, isto significa actividades separadas e/ou paralelas. O parceiro autista pode necessitar de muito tempo para si próprio e/ou de tempo extra para prosseguir os seus interesses especiais.


A transição do trabalho para casa pode ser stressante para o seu parceiroautista. Um intervalo sozinho imediatamente após a chegada a casa é muitas vezes descrito como crítico pelos homens autistas. Sem compreender e planear esta importante pausa de transição, pode ocorrer um bloqueio na relação.


O tempo de lazer em conjunto pode ser uma oportunidade importante para criar laços. Incentivem o humor na vossa vida em comum. Isso ajudará a melhorar a relação e a aliviar algum do stress extra. Pode ser maravilhoso se conseguirem encontrar as actividades certas para desfrutarem juntos. Isto pode incluir a exploração de interesses especiais por parte de cada um de vós. No início, pode ser necessário ter mais paciência, especialmente se for importante estabelecer alguns limites. Também podem ser exploradas actividades paralelas. Ambos estão na mesma sala ou espaço, mas podem estar envolvidos em actividades diferentes durante um período de tempo. Pode ser útil decidir antecipadamente o período de tempo designado. Pode ser definido um temporizador ou outro lembrete concreto. Seja criativo!


O seu parceiro pode necessitar de um plano de fuga quando a socialização se torna demasiado intensa ou estimulante. Como já foi referido, um plano que os casais utilizam frequentemente é conduzir dois carros, para que o parceiro autista possa sair antes que o seu nível de stress se torne demasiado elevado e provoque uma paragem ou um colapso.


Talvez tenha descoberto que o seu parceiro se sente muito satisfeito por passar muito tempo a perseguir um interesse especial. Esta pode ser uma técnica importante para o acalmar. É importante que este tempo seja equilibrado com outras actividades da vida e com o tempo que passam juntos. Se possível, este tempo pode ser programado mas flexível. Em alturas de maior stress para o seu parceiro autista, ele pode precisar de mais tempo para perseguir os seus interesses e/ou de tempo a sós.


Ao mesmo tempo, pode ser necessário reservar tempo para os seus interesses individuais. Se isto incluir uma socialização adicional, poderá ter de procurar agendar tempo com os amigos, inscrever-se em clubes, fazer voluntariado e/ou perseguir outros interesses que envolvam outras pessoas. É possível que necessite destas actividades exteriores e oportunidades sociais para se relacionar com outras pessoas, para além da sua satisfação emocional com o seu parceiro.


Parece simples da forma como está escrito. Obviamente que é mais complexo e desafiante, até porque estamos a falar de mudanças no comportamento humano, mas é fazivel. Além disso, este caminho não tem de ser feito sozinho. Seja a pessoa autista do casal pode ter acompanhamento individual junto de um profissional de saúde especializado. Mas também o casal poderá beneficiar de um acompanhamento de terapia de casal. Neste caso, e como já referi nos textos anteriores, estas reflexões são todas elas conseguidas nas partilhas conjuntas com a Dra. Teresa Carvalho (teresa.carvalho@pin.com.pt), ela sim, é terapeuta de casal.




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