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Quem é que não ama o seu marido autista? (1ª parte)

Eu sei que o título faz lembrar o nome de um qualquer concurso de televisão, mas não é! Ainda que por vezes os casamentos o pareçam ser - um concurso de televisão. Vamos com algum receio no inicio. Ou então foi alguém que nos inscreveu sem que nos tivesse perguntado se estaríamos interessados. Mas depois acabamos por ir e até nos entusiasmamos. Ainda que ao longo do processo possamos perceber que aquilo afinal não é tão bem assim tal qual o vemos em casa no conforto do nosso sofá!


Nada daquilo que lhe escrevi lhe fez sentido? É compreensível. Até porque nos casamentos há coisas que parecem não fazer sentido. E ainda mais quando um dos membros do casal tem um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo. No texto de hoje o sorteado é o homem. Mas fiquem tranquilos e tranquilas porque também há mulheres casadas e que têm um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo. Além de que também existem situações em que ambos são do espectro do autismo. Ou outras em que apesar de o serem ainda nem sequer o sabem. E apesar de estar a colocar as questões dos casais num registo heterossexual, fiquem tranquilos porque também abordarei as situações em que o casal será homossexual. A variedade é tão grande, tal como os casamentos o são, e a própria heterogeneidade no espectro do autismo.


É um desafio para a maioria dos casais encontrar um equilíbrio entre as suas necessidades e expectativas e as necessidades e expectativas do seu parceiro. Numa relação em que uma pessoa se encontra no espectro do autismo, é provável que haja muito mais oportunidades para mal-entendidos e frustrações. Encontrar um caminho para uma relação respeitosa, amorosa e duradoura é o desejo de todos os casais empenhados.


Nos últimos anos, tem sido útil o facto de haver mais informação e recursos centrados nas relações neurodiversas. Há mais informação disponível para casais e indivíduos, incluindo mais informação para mulheres, em relações com homens do espectro do autismo (assim como o contrário).


Em primeiro lugar, saiba mais sobre a Perturbação do Espectro do Autismo e de como esta impacta no seu marido. O autismo é uma perturbação neurobiológica que afecta a perceção, a comunicação, as competências sociais, a aprendizagem e o comportamento. A informação processada pelos sentidos pode facilmente sobre-estimular uma pessoa autista. Por outro lado, uma pessoa autista também pode ter dificuldade em processar a informação dos seus sentidos e ser pouco reactivo, não reactivo e/ou ter uma resposta única à informação sensorial.


A comunicação é frequentemente processada e interpretada de forma diferente para uma pessoa autista. A comunicação verbal é frequentemente processada mais lentamente e as palavras são interpretadas literalmente. As pessoas autistas têm frequentemente dificuldade em manter-se no tópico e em manter uma conversa. As competências sociais também são afectadas. O contacto visual pode ser difícil e, por vezes, as expressões faciais podem não refletir os verdadeiros sentimentos de um indivíduo. As pistas sociais são muitas vezes perdidas ou mal interpretadas. As pessoas autistas não sabem bem como se relacionar com os outros. Cada pessoa apresenta os seus desafios de forma diferente. Além de que muitas pessoas autistas sofrem com sintomas de ansiedade.


É provável que o seu parceiro tenha défices nas funções executivas. As tarefas de função executiva incluem planeamento, organização, definição de prioridades, gestão do tempo, regulação emocional e controlo de impulsos. A inércia, tanto para começar como para parar tarefas, pode ser um desafio para as pessoas do espetro do autismo. Estes défices de funções executivas podem ser erradamente atribuídos à falta de motivação e/ou a problemas de comportamento ou de personalidade. Os parceiros que não pertencem ao espectro são muitas vezes responsáveis pela execução de muitas tarefas de função executiva na relação.


Se se tratar de um novo diagnóstico, você e/ou o seu parceiro podem estar a tentar aceitar o diagnóstico. Chegar à aceitação pode ser difícil para um de vós ou para ambos. À medida que procura aprender mais sobre a PEA e como esta afecta o seu parceiro e a sua relação, é provável que esteja a lamentar a perda de expectativas anteriores.


À medida que vai aprendendo mais e trabalhando para reconhecer o papel que a perturbação do espectro do autismo desempenha na sua relação, será útil procurar profissionais experientes e/ou juntar-se a um grupo de apoio para mulheres com homens do espetro do autismo. Estes recursos estão disponíveis, mas podem ser difíceis de encontrar. Também pode ser útil fazer uma lista das qualidades positivas e desejáveis que a atraíram para o seu parceiro. É importante tê-las em mente, especialmente quando se está a atravessar uma fase difícil na relação.


Também será útil manter uma lista das suas qualidades positivas. Pode ser difícil lembrar-se destas características positivas sobre si próprio quando se encontra no meio de momentos muito difíceis e confusos. Lembrar-se das características positivas, tanto suas como do seu parceiro, aumentará a sua autoestima e ajudará a motivá-lo enquanto ultrapassa os desafios da sua relação.


Em segundo, aprenda a reconhecer e lidar com as necessidades sensoriais e problemas com o seu parceiro. Os problemas sensoriais afectam muito frequentemente as pessoas autistas. Como mencionado anteriormente, um ou mais dos sentidos podem ser afectados. Os sentidos podem ser demasiado sensíveis (hipersensíveis) e/ou pouco sensíveis (hiposensíveis). Algumas pessoas autistas são hipersensíveis a vários tipos de iluminação. Por exemplo, vêem o piscar e/ou ouvem o zumbido das lâmpadas fluorescentes. Para alguns, as dores de cabeça são despoletadas. Uma pessoa autista pode ser demasiado sensível a vários cheiros e/ou sons do ambiente. O toque leve pode parecer uma picada de alfinete, mas a picada real pode não ser sentida de todo.


Em algumas situações, uma pessoa autista pode parecer não processar a informação sensorial de um ou mais dos cinco sentidos familiares: visão, olfato, som, paladar e tacto. Pode parecer não ter consciência do que está à vista e/ou processar as palavras como "ruído". Estas situações podem parecer muito curiosas. Três outros sistemas sensoriais menos conhecidos são também frequentemente afectados em muitas pessoas do espectro do autismo. São eles o sistema vestibular (equilíbrio), o sistema propriocetivo (movimento muscular/articular, coordenação, planeamento motor e noção do corpo no espaço) e o sistema interoceptivo (estado das funções internas do corpo).


Pareceu-lhe muita informação? É compreensível. Mas há mais coisas que são importantes de falar. E como não há duas sem três, no próximo texto abordaremos outros aspectos. Até lá e se tiver identificado dificuldades suficientes não hesite em procurar contactar um profissional de saúde especializado na área. Seja a Dra. Teresa Carvalho (teresa.carvalho@pin.com.pt), colega e amiga com quem partilho algumas destas ideias, ou um profissional especializado na área do autismo no adulto.



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