"Welcome to where time stands still
No one leaves and no one will
Moon is full, never seems to change
Just labeled mentally deranged"
Sanitarium, Metallica
Há textos que precisam de um enquadramento musical para correr melhor. É o caso deste! E nada como os Metallica para ajudar quando se trata de falar sobre saúde mental e as politicas existentes.
Eu não sou músico e muito menos sei fazer letras para músicas, mas vou tentar fazer o meu melhor e criar umas estrofes e um refrão! Aqui vai!
1. Ao longo da vida (Refrão): Não é de agora que sabemos que a Perturbação do Espectro do Autismo existe ao longo da vida da pessoa. E como tal, foram sendo criadas as mais variadas respostas para as pessoas autistas e familiares (cuidadores). Inclusive foi sendo criado a necessidade de haver profissionais preparados para trabalhar mais proximamente e individualizado com as pessoas autistas (e.g., assistentes, professores de educação especial, etc.). Contudo, muitas pessoas autistas, familiares e profissionais de várias áreas sabem o quanto difícil e desafiante é ter de encarar todo este processo. Seja no processo que é por demais burocrático, mas porque ainda continua a colocar a questão de as pessoas autistas poderem estar a beneficiar de algo que talvez não seja necessário. Como é o caso de certas medidas de acomodação na escola quando o aluno com este diagnóstico é visto como sendo inteligente. Mas parece que à medida que se caminha para o final da adolescência estas mesmas respostas psicossociais parecem diminuir. E ainda mais quando se entra na vida adulta.
2. Os apoios existem: Muitas vezes ouvimos dizer, nomeadamente dos representantes políticos com responsabilidade nesta área (e.g., segurança social, saúde, etc.) que os apoios existem. Mas é preciso ser dito que os apoios existem por exemplo para as pessoas que têm um atestado multisusos com um nível de incapacidade igual ou superior a 60%. E muitos saberão, até por experiência própria o quanto difícil é de o obterem. Seja porque é um processo demorado. Mas principalmente porque o entendimento de quem está nas juntas médicas parece não ir necessariamente ao encontro das reais necessidades e dificuldades da pessoa. E esta questão aplica-se tanto às respostas relacionadas com subsídios prestados a pessoas com deficiência, mas também para a própria possibilidade de estar abrangido por medidas legais que integram a pessoa no mercado de trabalho e as protegem, como é o caso da Lei 4/2019.
3. Mas as pessoas estão diagnosticadas: Se é verdade que há muitas pessoas autistas adultas por diagnosticar, também é verdade que há tantas outras já diagnosticadas, e algumas inclusive durante a infância. Contudo, as pessoas autistas que foram sendo seguidas e acompanhadas no serviço nacional de saúde nas consultas de desenvolvimento viram a sua vida alterada de um dia para o outro quando atingiram a maioridade e deixaram de ter respostas a este nível porque lhes foi dito que aquela consulta já não se adequava à sua idade. E ainda que isso faça sentido, é fundamental que a pessoa possa ser devidamente encaminhada para um serviço de adultos. Mas estou certo que muitos saberão, mais uma vez por experiência própria, que essas respostas escasseiam, para não dizer pior.
1. Ao longo da vida (Refrão): Não é de agora que sabemos que a Perturbação do Espectro do Autismo existe ao longo da vida da pessoa. Mas afinal o que é que pensamos que acontece às pessoas autistas a partir de certa altura da sua vida? Desapareceram? Curaram-se? Certamente que nem uma coisa nem outra, mas ficam garantidamente mais frágeis e vulneráveis com todo este processo. E não é por acaso que mundialmente se fala dos números dramáticos de suicídio e ideação suicida em pessoas autistas. E como é que podem falar de intervir para capacitar a pessoa autista para ser autónoma e independente quando depois chega à vida adulta e numa percentagem significativa das vezes não consegue ter a possibilidade de integrar o mercado de trabalho e muito menos ter a capacidade de assegurar uma habitação própria.
4. Qual é a realidade das pessoas: Muitas vezes nos perguntamos sobre a forma como as politicas de saúde e sociais são construídas e com que bases. No caso do autismo, os decisores parecem não estar de todo informados sobre a realidade vivida pelas pessoas autistas, familiares, mas também profissionais que trabalham nesta área e da necessidade de capacitar mais e melhor para uma outra resposta, mas também formar mais profissionais para dar uma resposta mais célere no processo, seja de diagnóstico, mas também de intervenção.
Eu disse que não era músico e muito menos que sabia fazer letras para músicas. Sou psicólogo clínico e trabalho com pessoas autistas adultas, mas também sou cidadão e quero continuar a participar na mudança que urge acontecer à demasiado tempo.
Obrigado Metallica!!
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