Nestes últimos dias voltámos a ouvir devido às eleições para as Legislativas a 10 de março aquela mítica frase, "Os tempos de antena a emitir nos termos da lei, relativos à campanha eleitoral no âmbito das Eleições Legislativas, são da responsabilidade das candidaturas concorrentes.".
Mas esta campanha de que vos irei falar é da inteira responsabilidade de todos nós! E tem a ver com a empregabilidade das pessoas autistas adultas. E mais uma vez em Portugal não se sabe a verdadeira realidade existente nesta área e como tal vamos contando com outras realidades bem próximas no espaço europeu, mas que nos podem informar sobre a realidade e inclusive o que podemos desde já fazer. E aproveito para desabafar que em determinadas situações me parece absurdo esperar por estudos que ainda não foram feitos quando as realidades e certos fenómenos são semelhantes quantitativa e qualitativamente a outros países. E como tal podemos aproveitar estes estudos realizados em outros países para poder ajudar a produzir medidas que ajudem a alterar a realidade.
1 em cada 100 pessoas adultas tem um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo.
No espaço europeu temos a estimativa de existirem cerca de 5 milhões de pessoas autistas.
Em Portugal não temos bem claro o número de pessoas autistas adultas, mas mais uma vez podemos usar estes números obtidos em realidades próximas e semelhantes à nossa.
Também podemos dizer com alguma segurança que cerca de 27% a 30% das pessoas autistas adultas se encontram empregas e com algum tipo de contrato. Ou seja, apenas 3 em cada 10 autistas se encontra com emprego e por conseguinte 7 em cada 10 não está empregada! O que quer dizer que uma percentagem significativa desta população não se encontra a trabalhar e com um contrato de trabalho quando o poderia, já que apresenta competências para tal e desejo para o concretizar.
Como tal estamos a falhar às pessoas autistas, às suas famílias, mas também a todos nós enquanto Sociedade. E como tal parece-me importante poder constatar aquilo que representa a realidade deste grupo de pessoas.
Apesar do seu desejo de trabalhar, as últimas estatísticas (realizadas em outros países) mostram que apenas 3 em cada 10 pessoas autistas em idade activa estão empregadas, em comparação com cerca de 5 em 10 para todas as pessoas com deficiência e 8 em 10 para as pessoas sem deficiência.
As pessoas autistas enfrentam a maior diferença salarial de todos os grupos de pessoas com deficiência, recebendo um terço menos do que as pessoas sem deficiência em média.
Os licenciados autistas têm duas vezes mais probabilidades de estar desempregados ao fim de 15 meses do que os licenciados sem deficiência, sendo que apenas 36% encontram trabalho a tempo inteiro durante este período.
Os licenciados autistas têm mais probabilidades de serem sobrequalificados para o emprego que têm, têm mais probabilidades de ter contratos de zero horas e menos probabilidade de estarem num emprego permanente.
Existe um vasto leque de potenciais barreiras ao trabalho para as pessoas autistas: má preparação por parte dos empregadores, práticas de contratação injustas, processos pouco claros e atitudes desactualizadas e desajustadas da realidade e do conhecimento cientifico.
Desde tenra idade, as pessoas autistas têm menos probabilidades do que os seus pares, de ter tempo, contactos ou apoio para procurar experiências relacionadas com o trabalho e os técnicos/conselheiros de carreira estão muitas vezes mal preparados para apoiar as pessoas autistas. Este facto tem repercussões nas suas perspectivas de emprego de forma muito marcada.
As pessoas autistas têm muito mais experiências negativas em entrevistas, tarefas de grupo e testes psicométricos. As pessoas autistas que procuram emprego têm de navegar por descrições de emprego vagas e genéricas, ambíguas e ambientes sensoriais desafiantes, muitas vezes com uma frequentemente ênfase nas competências sociais e não nas competências profissionais.
Muitos sentem que têm de mascarar os seus traços autistas, seja para encontrar, mas também para manterem o seu trabalho, não obstante este aspecto representar um agravamento dos sintomas de ansiedade, depressão e cansaço físico e emocional.
Muitos não recebem o apoio ou os ajustamentos necessários para poderem desempenhar o seu papel face a ambientes sensoriais e sociais inacessíveis.
Muitos adultos autistas não estão conscientes dos seus direitos legais em matéria de adaptações razoáveis.
Apenas cerca de 35% dos trabalhadores autistas são totalmente abertos sobre o facto de serem autistas, sendo que 1 em cada 10 não revelam a ninguém no trabalho. Para aqueles que o fazem, a altura mais comum para o fazer é depois de começar a trabalhar, o que revela um receio persistente e bem fundamentado de discriminação durante o processo de recrutamento.
O acesso a adaptações é ainda muito variável, cabendo geralmente ao trabalhador autista identificar e defender as adaptações.
Cerca de um terço dos trabalhadores autistas não se sentiram capazes de discutir as suas necessidades de adaptação e, entre os que solicitaram e dos que pediram adaptações, mais de um quarto foi recusado e mais de 1 em cada 10 considerou que a adaptação foi mal implementada.
Face a esta realidade como é que qualquer um de nós, ainda que com responsabilidades diferentes neste processo, pode continuar na mesma?
As empresas e os empregadores precisam de saber mais e melhor quem são as pessoas autistas adultas. As empresas de recrutamento e selecção precisam de saber mais e melhor quem são as pessoas autistas adultas. As pessoas de uma maneira geral precisam de saber mais e melhor quem são as pessoas autistas adultas. É repetido!? Sim, é verdade, mas constitui a realidade. As pessoas precisam de saber que as pessoas autistas adultas existem e que várias estão na sua presença, ainda que possam não ser reconhecidas pois estas estão a camuflar o seu comportamento porque já não é a primeira vez que ouviram da sua parte ou de outros um qualquer comentário negativo sobre o autismo.
Qualquer um de vocês adultos, tal como eu, somos cidadãos e cidadãs que cumprimos com os nossos deveres e pagamos os impostos, certo? Eu não sei por vocês, mas eu preferia que muitas destas pessoas autistas adultas pudessem estar a trabalhar e a contribuir para a construção de riqueza e mais valia para o país do que estarem a absorver dinheiros públicos dos contribuintes nas pensões (aquelas que são atribuídas), quando têm competências académicas e profissionais, além de manifestarem vontade e desejo em o fazer.
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