Ao fim de 12 anos de episódios hilariantes a série Teoria do Big Bang chegou ao fim. Alguns perguntaram-se - "E agora?" ou "Que sentido pode haver a partir de agora?". Tal como muitos outros adolescentes normativos o questionam, os jovens autistas também perguntam sobre o propósito e o sentido da vida. Tal como diz o Sheldon Cooper, " I'm meant for greater things, like unraveling the mysteries of the universe, not determining when it's safe to pass a stopped school bus on a country road.".
Pergunta de retórica - Quem nunca se questionou acerca do propósito e significado da vida que levante o braço? Silêncio!
Apesar da profundidade da questão o seu teor introspectivo é fundamental. Alguns autores referem a relação deste questionamento com um desenvolvimento na juventude óptimo. Procurar e ter consciência de um propósito para a vida parece estar relacionado com outras questões igualmente importantes como esperança, satisfação com a vida e identificação com o processo de desenvolvimento. Jovens com um propósito são mais propensos a relacionar-se com as suas actividades e respectivo percurso académico. Por exemplo, adolescentes que têm a crença que o seu trabalho académico é mais relevante para a sua vida parecem manter melhores resultados escolares.
Qualquer um de nós na adolescência ou em outros momentos mais significativos da vida pensamos acerca do propósito e significado da vida. Procuramos colocarmo-nos em perspectiva e pensar acerca da nossa existência num plano fenomenológico.
O propósito é um constructo multidimensional que liga interesses ou objectivos que são significativos para o próprio às maneiras pelas quais esses interesses ou objectivos podem influenciar positivamente o mundo além do Self. Ou seja, os objectivos muitas vezes fornecem um veículo para tornar concreto e aprovar um propósito, mas o objectivo em si está além de qualquer objectivo único. Ou então, este propósito pode ser descrito como um objectivo de vida que organiza e inspira objectivos, agindo como uma bússola que direcciona o comportamento em vez de governá-lo.
Na Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), as características da sua condição dizem-nos que a interacção e comunicação social aparecem comprometidas com diferentes graus. Ale´m de todas as dificuldades existentes, o compromisso nas competências de comunicação são as que mais comprometem a existência de um propósito. Em boa parte porque são estas mesmas competências comunicacionais que permitem encontrar uma identificação do próprio com características similares nos pares. Isto porque a construção da narrativa acerca do propósito da vida é crucial e por norma esta narrativa é co-construida com o Outro o que requer competências relacionais e comunicacionais.
Penso que uns e outros nos centramos demasiado nos deficits e nas dificuldades existentes na PEA e dedicamos pouca atenção a outros aspectos honestamente mais importantes. Não é pelo facto de existirem características que parecem comprometer a capacidade de pensar acerca do Outro e até de si mesmo, nomeadamente a nível metacognitivo. Ou na capacidade de intuir acerca dos sentimentos e pensamentos do Outro tal como inscrito na Teoria da Mente. Ou no facto mais vulgarizado no senso comum de que os autistas não se preocupam com os aspectos globais da vida que isso tenha de corresponder necessariamente à verdade. Porque não corresponde.
As exigências relacionadas com a identidade com o processo de desenvolvimento pode frustar os adolescentes autistas à medida que avançam ao longo da vida e procuram descobrir e construir o seu propósito de vida. Muito provavelmente porque sentem frequentemente um conjunto variado de dificuldades no ultrapassar dos obstáculos. Não somente pelas suas características mas principalmente pela intersecção destas com a maneira como a Sociedade ainda continua a encontrar dificuldades em ser verdadeiramente inclusiva e respeitar a neurodiversidade. Os desafios na área de criação de objectivos e planeamento geral pode criar obstáculos a estes jovens. Alguns investigadores têm identificado que estes jovens têm objectivos e sonhos para o futuro, um dos componentes para o desenvolvimento do propósito da vida, mas que frequentemente se sentem inseguros em perguntar questões relacionadas e obter respostas que possam estar a procurar para clarificar mais este mesmo propósito.
Uma outra área em que estes jovens podem encontrar uma oportunidade para a construção deste caminho e o propósito para a vida é através dos seus interesses restritos. Aquilo que durante algum tempo foi visto quase exclusivamente como sendo negativo e como tendo um impacto bastante grande na vida do próprio. Mas que quando enquadrado conjuntamente com o próprio, a família e o contexto é possível construir um outro significado que contribua para este mesmo propósito de vida.
É fundamental poder pensar que apesar das características de uns e de outros, sejam autistas ou neurotípicos, cada um terá dentro da sua expressão uma visão da vida. Constituída por um ou mais propósitos e significados. Ainda que seja importante compreender as dificuldades que podem ocorrer no processo para auxiliar no caminho até lá.
Commenti