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Lucy in the sky with diamonds: O espectro no consumo de substâncias

Este título tão conhecido dos Beatles de 1967 ficou na altura também conhecido pela especulação da relação do mesmo ao LSD (Lucy Sky Diamonds). Verdade ou não a associação manteve-se. Outras associações tais como a população psiquiátrica ter uma maior prevalência na taxa de consumo de tabaco comparativamente aos restantes já não restam tantas dúvidas. E ultimamente tem sido estudo a associação entre a Perturbação de consumo de substâncias e a Perturbação do Espectro do Autismo.

"Come in here, dear boy, have a cigar, You're gonna go far, You're gonna fly high, You're never gonna die, You're gonna make it if you try, They're gonna love you."


Have a cigar, Pink Floyd


Aproximadamente 29,5 milhões de pessoas (0,6%) da população adulta global, têm uma Perturbação Relacionadas com Substâncias (PRS) e Perturbações Aditivas. Existem várias condições de saúde mental associadas a altas taxas de PRS, incluindo Perturbações da Personalidade (25% a 51%), Perturbação Afectiva (16% a 35%), Ansiedade (16% a 18%), Esquizofrenia (47%), Perturbação Bipolar (56%) e Perturbação Traumática de Stress ( 37%) . Certas perturbações do desenvolvimento, nomeadamente a Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção (PHDA), também estão significativamente representadas no tratamento da Perturbação Relacionada com Substâncias. Por exemplo, m estudo de metanálise recente mostrou uma comorbilidade de 23% da PHDA numa população adulta mista de PRS, variando de 10% a 54% em diferentes estudos. Por outro lado, entre pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), as PRS são consideradas relativamente incomuns.


A PEA é uma perturbação do neurodesenvolvimento caracterizada por dificuldades na interação e comunicação social, juntamente com um repertório restrito de actividades e interesses. Devido às suas dificuldades a nível social e de comunicação, muitos adolescentes e adultos com PEA possuem redes sociais muito limitadas fora da família e foi sugerido que esse pode ser um factor protetor para as Perturbações Aditivas e que os jovens com PEA têm menos probabilidade de serem influenciados por seus pares quando se trata de experimentar álcool ou drogas.


No entanto, pesquisas recentes sugerem que as taxas de Perturbações Aditivas entre pessoas com PEA podem ser mais altas do que se supõem. Uma revisão sistemática recente da literatura identificou 18 estudos que examinaram a associação entre PEA e PRS. Um total de 11 artigos explorou especificamente a frequência de PRS na PEA, mas relatou que as taxas variaram amplamente, de 0,7% a 36%, e a maioria dos estudos envolveu amostras altamente selecionadas, como agressores ou pacientes em hospitais psiquiátricos. Ainda assim, os resultados têm mostrado que a prevalência desta associação ocorre quando há comorbilidade entre PEA e PHDA. Os estudos, nesta e em outras áreas devem ser lidos com cautela, sem alarmismo e principalmente com disponibilidade para reflectir, seja sobre o fenómeno mas também sobre os casos que constituem a realidade. E esta realidade tem sido cada vez mais prevalecente nos casos que são avaliados e acompanhados em consultas de psicologia para autistas.


A maior frequência de ansiedade e outras perturbações psiquiátrica em pessoas com PEA tem sido proposta como uma razão principal para o uso de álcool ou drogas ilegais. Outras razões para o uso de drogas ou álcool, relatadas por pessoas com PEA, incluem uma redução na inibição social, capacidade de evitar problemas e ou obter "paz de espírito", passar o dia ou superar a frustração, etc. Contudo, é importante enfatizar, que, embora o uso de substâncias tenha sido relatado para resolver problemas relacionados com a PEA no curto prazo. No longo prazo, o abuso de substâncias aumentou as dificuldades já em si comprometidas. O abuso de substâncias pode representar um factor de vulnerabilidade específico para indivíduos com PEA, pois a intoxicação pode diminuir ainda mais a capacidade de antecipar as consequências de seu comportamento e dificultar ainda mais o comportamento o que por conseguinte acaba por colidir com o sistema judicial e penal.


Curiosamente, o consumo de tabaco também tem forte probabilidade de relação com diversas perturbações psiquiátricas. No entanto, na Perturbação Obsessiva-Compulsiva e na Perturbação do Espectro do Autismo este número decresce significativamente. É comum os meus clientes autistas referirem uma verdadeira e completa aversão ao fumo de tabaco e aos fumadores. Chegando mesmo a restringir o contacto social com amigos ou colegas que tenham passado a ter este comportamento. E o mesmo também aparece ainda que em menor número em relação ao comportamento de beber (i.e., ficar embriagado). mas não tanto em relação ao consumo de álcool. Muito daquilo que é referido passa pelo comportamento em si e pelas consequências. No caso do tabaco a associação a uma morte prematura justifica o absurdo da escolha. E no caso do consumo excessivo de álcool e a respectiva consequência na alteração do comportamento parece justificar o repugno pela situação. Grande parte das vezes existe um "Não compreendo porque é que as pessoas querem fumar se sabem que se estão a matar!" ou "Não percebo porque é que as pessoas se embebedam para fazer certas figuras e depois não se lembram!". Uma outra razão passa pela hipersensibilidade olfactiva e que no caso do tabaco e no hálito de alguém embriagado parece fácil de compreender.


No caso dos comportmentos de consumo sem substância, associado à utilização de ecrãs, seja videojogos, vídeos, filmes e televisão de uma maneira geral, também parece haver uma prevalência significativa nas PEA e mais especificamente nos rapazes. Para além dos inúmeros factores e variáveis associadas e que remetem para factores de risco e de manutenção da adição sem substâncias, há outras características das PEA que o justificam. Desde comportamentos de exploração sensorial visual ou da capacidade de estimulação que determinados vídeos/filmes conseguem ter em alguns autistas que apresentam um maior embotamento afectivo.


Seja porque o consumo de substâncias alivia os sintomas de ansiedade ou os ajuda a ter estratégias de enfrentamento face às situações sociais, ou porque têm algum compromisso neurobiológico no sistema dopaminérgico. O certo é que o consumo de substâncias a longo prazo tem um impacto significativo nas alterações comportamentais e no prejuízo significativo em vários domínios da vida da pessoa com PEA. Se a intervenção psicológica nas PEA é frequentemente alterada para se adaptar às características especificas da PEA. No caso de haver patologia dual - PEA e Perturbações Aditivas esta dificuldade aumentada. Para além do impacto social e relacional que este mesmo comportamento de consumo de substâncias acaba por ter. É importante ter em conta que o comportamento de consumo de substâncias pode ele próprio mascarar algumas das características comportamentais existentes nas PEA e isso atrasar a própria identificação.

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