Muito se tem falado nestes últimos anos sobre a inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Têm sido desenvolvidos alguns esforços legislativos com impacto social na maior contratação destas pessoas. Contudo, continuamos a verificar que a realidade fica muito aquém do desejado. E são muitos os que se continuam a perguntar porque é que não tem havido maior nível de empregabilidade nesta área tendo em conta a informação cada vez mais e melhor desenvolvida e difundida para explicar à Sociedade quem são as pessoas que pertencem a este grupo de pessoas com deficiência e qual o seu perfil de funcionamento, assim como as Organizações podem desenvolver esforços para a sua contratação. E no caso das pessoas autistas adultas, esta situação da empregabilidade parece ser ainda mais grave, mesmo quando comparamos as pessoas autistas com pessoas com dificuldade intelectual e desenvolvimental ou deficiência motora. Ou seja, apesar de podermos verificar, principalmente na Perturbação do Espectro do Autismo (nível 1), que as pessoas reúnem todo um conjunto de competências profissionais, técnicas e com formação adequada ao desenvolvimento de um desempenho capaz. Ainda assim, as pessoas autistas adultas continuam a ver em muito as suas tentativas de envio de candidatura espontânea e de resposta a ofertas de emprego invalidadas.
Apesar da ambição dos adultos autistas de terem um emprego, as oportunidades de emprego competitivo para este grupo são limitadas. O emprego não é apenas um direito usufruído por outros na sociedade, mas empregar adultos autistas também traz benefícios económicos ao diminuir a perda de produtividade e os custos de recursos para este grupo. Mas ainda assim, esta informação parece não ser suficiente para demover as pessoas com responsabilidade nas empresas para darem orientações para a abertura de contratação de pessoas autistas. E como tal, a questão continua a manter-se: Porque é que as empresas não estão a fazer mais e melhores esforços para a contratação de pessoas autistas?
Se pensarmos naquilo que muitas vezes as empresas referem neste tipo de situações de contratação de pessoas com deficiência. A percepção dos custos envolvidas nestes processos de contratação e das mudanças e adaptações que sentem ter de fazer nas suas empresas para a integração destes trabalhadores, parece faze-los pensar apenas em custos e não em benefícios ou ganhos.
A ideia pode gerar urticária e anti-corpos, isto de pensar na questão do balanço entre custos e benefícios quando se pensa na contratação de pessoas com deficiência. Há quem possa dizer que até parece desumano. E ainda que a situação seja dramática para as pessoas autistas em questão, mas também para as suas famílias e Sociedade de uma maneira geral, ainda assim parece importante abandonar um pouco este discurso e poder pensar naquilo que possa fazer mudar a forma de pensar das pessoas responsáveis pela contratação nas empresas.
Até porque pode soar a pouco dignificante para a pessoa com deficiência estar a sentir que está a ser contratada por algum sentimento de misericórdia por parte de um responsável da empresa que quer ficar bem com a sua consciência e desenvolver algum projecto de responsabilidade social. Uma pessoa autista, assim como uma qualquer outra pessoa com deficiência, deverá desejar querer ser contratada por aquilo que são as suas competências e mais valias apreendidas e desenvolvidas através de um projecto de formação ao longo do tempo e adequado para o exercício das funções para as quais se candidata. E nada disto deverá invalidar todo um conjunto de medidas legislativas e que vão criar uma descriminação positiva, tal como a criação de cotas para as pessoas com deficiência e de emprego protegido.
Mas as empresas e as pessoas com responsabilidade dentro destas para por em prática uma gestão que faça crescer a empresa deve estar munido de informação suficiente e adequada acerca das mais valias que representa a contratação de pessoas autistas. Ou seja, precisamos não somente de continuar a referir às empresas o que é o autismo e quais são as suas características e de como desenvolver medidas de acomodação para a melhor integração das pessoas. Mas poder sublinhar de uma forma visível aquilo que são as suas competências. E não apenas as competências enquanto pessoas autistas no global, mas sim nas competências que cada pessoa autista candidata aquele emprego representa para o desenvolvimento da função. E também sublinhar que ao referir a importância das competências das pessoas autistas não me estou a referir aos super-poderes das pessoas autistas e que por vezes são advogados em alguns sectores da Sociedade. Estou a falar de competências, algumas que são existentes desde sempre na pessoa e que se prendem com o seu perfil, mas também aquelas que são aprendidas, trabalhadas e desenvolvidas ao longo da sua formação e vida.
Esta ideia parece inclusive contrariar a ideia ainda vigente de olhar para as pessoas autistas somente como alguém com deficit e dificuldades. Mas antes poder olhar para a pessoa autista como um todo, e inclusive poder compreender que aquilo que possa ser à partida olhado num primeiro relance como um deficit e que tenha uma designação clinica. Possa ser entendido como uma potencial característica para se tornar uma mais valia. Por exemplo, o hiperfoco, se por um lado pode ser considerado com um achado clinico para junto com outros poder ser tido em conta para a atribuição de um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo. Também pode vir a ser considerado com uma característica em que a própria pessoa se tornou um especialista tendo em conta o investimento cognitivo, intelectual e de tempo que tem dedicado ao aprofundamento do tema. Assim como os aspecto da Coerência Central em que se sabe que algumas das pessoas autistas poderão ter uma maior propensão para a detecção de padrões. Esta característica poderá ser mais uma vez olhada como uma ferramenta de excelência para o desenvolvimento de determinadas tarefas, sejam elas mais repetitivas ou não, tendo em conta o seu maior nível de tolerância à frustação. O facto de algumas pessoas autistas poderem apresentar maior necessidade de uma rotina pré-estabelecida, além de poder trazer alguns desafios quando há uma maior previsibilidade. Contudo, esta sua características poderá representa um beneficio com grande potencial para trabalhos com determinado nível de precisão e que envolvam protocolos de execução mais rotineiros. Assim como a característica de muitas pessoas autistas que primam pelo cumprimentos integral e exímio do que lhe foi pedido para executar levando à letra toda a informação que foi referida. Se por um lado pode ser um desafio, principalmente quando há uma maior subjectividade na comunicação. Por outro lado podemos ter uma pessoa com uma boa adequação para trabalhos mais uma vez de alta precisão e que envolvam esta forma de executar tarefas. E se pensarmos na comunicação verbal observada em algumas pessoas autistas que pode ser mais objectiva e concreta. Podemos pensar no quanto benéfico a mesma se pode tornar em situação de comunicação em reuniões de equipas em que há a necessidade de resumir a informação de uma forma capaz de informar todas as pessoas e não se perder tempo.
São várias as características das pessoas autistas que podem ser observadas como mais valias e ganhos representativos para as empresas, mas também por conseguinte para o Estado e Sociedade. No caso das empresas podemos pensar que a contatação de pessoas autistas representa um aumento da produtividade e diminuição dos custos de apoio. Por exemplo, já se perguntou porque é que um local de trabalho homogéneo em termos de falta de diversidade parece atingir um patamar de produtividade de vez em quando? Será que as pessoas não têm motivação para avançar, ou será que a aparente uniformidade de pensamentos e abordagens gera uma cultura invisível de fazer apenas o suficiente para não ser despedido? E se pensarmos que as pessoas autistas, neurodivergentes e com deficiência podem ser a peça que faltava no puzzle da produtividade. Até porque trazem frequentemente talentos, pontos fortes e perspectivas únicas para o local de trabalho, o que conduz a um aumento da produtividade, a uma melhor resolução de problemas e à inovação. Para além disso, empregar pessoas autistas, neurodivergentes e com deficiência ajuda-as a tornarem-se financeiramente independentes, o que, por sua vez, diminui a sua dependência dos subsídios do governo, ao mesmo tempo que reduz o custo de vários serviços de apoio à comunidade, como os cuidados a adultos. As organizações que contratam trabalhadores autistas obtêm uma força de trabalho com conhecimentos, competências e capacidades desejáveis, aumentando o capital intelectual associado a uma força de trabalho mais diversificada e melhorando a reputação e o capital social da empresa através das suas iniciativas de diversidade. Além de se verificar que os trabalhadores autistas têm menos faltas, mais probabilidades de chegar ao trabalho a horas, são mais fiáveis e têm taxas de rotatividade muito mais baixas do que os trabalhadores neurotípicos. E nas empresas onde se tem verificado uma contratação de pessoas autistas, os gestores responsáveis classificam o seu desempenho profissional como médio ou superior à média, até porque percebem que as pessoas autistas sendo contratados e verificarem que a sua empresa os apoia e incentiva isso produz um aumento na sua motivação e envolvimento no trabalho, além de mais conscienciosos em relação aos seus empregos.
Contratar pessoas autistas não representa apenas uma necessidade de acomodação do posto de trabalho e da empresa de uma maneira geral. Ou de desenvolver planos de formação para a sensibilização dos trabalhadores neurotipicos para a importância da inclusão e da (neuro)diversidade. Contratar pessoas autistas representa um ganho real para as empresas, seja do ponto de vista da produtividade e do envolvimento destes nas suas tarefas. Mas também um ganho para os próprios colegas neurotipicos que sentindo que fazem parte de uma organização inclusiva e diversa sentem que estão a participar para um Mundo melhor. Não é utópico poder pensar em desenvolver politicas de recrutamento e contratação inclusiva e ganhos para as organizações. Não acredita? Pergunte-me!!
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