Alguns poderão pensar que a pessoa na imagem está a experimentar novas técnicas de meditação. Ou então está a cumprir o plano de ginástica que o departamento de Ergonomia implementou. Mas não, está mesmo a dormir! E não, não está a dormir ao fim de ter estado a trabalhar mais de 12 horas seguidas.
Hoje, celebra-se o Dia Mundial do Sono, e apesar do sono ser uma área difícil para muitas pessoas, as pessoas autistas têm experiências de enormes dificuldades nesta esfera. Falem com a Dra. Mafalda Leitão que ela é a especialista na área.
Muitas pessoas autistas são susceptíveis de sofrer de perturbações do sono em algum momento das suas vidas. Mas a investigação e a clinica parecem ainda muito orientados para a compreensão e intervenção junto das crianças e jovens, e não tanto junto das pessoas autistas adultas. Existem várias razões para enquadrar esse facto, nomeadamente as perturbações do sono causarem uma grande disrupção na vida das crianças/jovens, mas também dos adultos cuidadores, etc. E porventura as pessoas autistas adultas vão encontrando estratégias de adaptação e acomodação, ainda que estas possam ser em muitas das vezes desadaptativas e disfuncionais, levando a perdurar a sua perturbação do sono, mas também afectando áreas maiores da sua vida. Ou então não consideram que a área do sono seja prioritária, quando têm outras áreas de vida com determinado compromisso e que consideram mais prejudiciais. Mas também terem a percepção que estas suas dificuldades sempre foram assim desde criança e como tal a sua crença face à possibilidade de não haver nada para fazer é bastante grande. Já para não falar da falta de informação existente e adequada para explicar às pessoas autistas adultas que é possível compreender e estudar o seu padrão de sono, avaliar a sua perturbação do sono e implementar uma intervenção médica e também psicológica para ajudar a fazer as mudanças necessárias. E inclusive ajudar a compreender que as mudanças positivas nesta esfera do sono irão ter um impacto igualmente positivo em outras áreas fundamentais e comprometidas da sua vida, tais como a ansiedade, disfunção executiva, regulação do humor, emocional e comportamental, cansaço, etc.
Das várias situações em que as pessoas autistas adultas experimentam como desafiantes e difíceis em relação ao sono pode incluir:
Ter dificuldade em instalar-se, relaxar e adormecer;
Acordar várias vezes durante a noite ou ter dificuldade em voltar a dormir depois de acordar para ir à casa de banho;
Aumento da ansiedade ou incapacidade de relaxar, causando insónia;
Dificuldades na interpretação das pistas sociais, em que não faz a ligação entre o facto de as outras pessoas da casa irem para a cama e a sua própria necessidade de dormir;
Secreção irregular da hormona do sono melatonina, que regula os padrões de sono, ou ter ritmos circadianos atípicos (relógio biológico);
Doenças neurológicas, como a epilepsia;
Diferenças sensoriais, como uma maior sensibilidade à luz azul dos smartphones, computadores portáteis e outros ecrãs, ou sensibilidade a determinados sons ou ruído branco, que podem ser perturbadores ou distrativos e mantê-lo acordado;
Problemas causados por alergias alimentares, que podem causar problemas gastrointestinais e desconforto, ou maior sensibilidade à cafeína ou a outros estimulantes, que podem perturbar o sono;
Hipersónia (dormir demasiado). O aumento da exaustão pode ser causado pelo stress adicional que as pessoas autistas sofrem em situações sociais.
Os exemplos e situações não se esgotam aqui. E como tal é importante poder dizer às pessoas autistas adultas que ainda não procuraram ajuda especializada nesta área do sono que o façam. E mesmo aquelas que já o procuraram e sentiram que não foi útil para mudar a sua situação, é importante insistir com o facto de pedir ajuda, até porque é possível de fazer mudanças significativas e com consequências grandes na sua qualidade de vida. Poder fazer um diário de sono (se não sabe certamente que uma especialista nesta área a irá ajudar), estabelecer uma rotina de sono (ainda que as rotinas sejam frequentes de se observar nas pessoas autistas como algo desejável, isso nem sempre corresponde à realidade, principalmente quando há comorbilidades com PHDA. Mas também porque a rotina do sono vai colidir com outras situações da vida da pessoa e das pessoas com quem vive, etc.). Também é fundamental criar um conforto adequado à sua pessoa no quarto e no local onde dorme (i.e., cama, calção, sofá, etc.). Assim como a roupa que usa para dormir e os lençóis/mantas, almofada, etc. Mas também não esquecer os aspectos relacionados com a alimentação e a importância de haver uma intervenção farmacológica para estes problemas.
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