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Foto do escritorpedrorodrigues

De casa em casa

Falarmos de saúde mental, promoção, intervenção e prevenção na saúde mental, principalmente em adultos é indissociável de questão de ter uma casa. Para haver saúde mental é vital haver uma casa, um lar, um porto de abrigo que seja contentor. Lembro-me em criança de ouvir Vínicius de Moraes - "Era uma casa muito engraçada, não tinha tecto não tinha nada...". Mas as casas precisam de tecto e para isso precisam de uma estrutura e no conjunto é fundamental haver meios para que os próprios consigam autónoma e independentemente sustentar essa mesma casa.

Vivemos em casa dos nossos pais até cerca dos 25 anos de idade. Em Portugal a média de idade de saída de casa dos pais é de cerca de 27 anos no caso dos rapazes. As raparigas é um pouco mais cedo. Ao fim deste tempo e principalmente nos últimos anos começa a ser feito um planeamento para esta transição. Por norma engloba a finalização dos estudos obrigatórios ou da universidade e a entrada no mercado de trabalho. Hoje comparativamente há alguns anos atrás as pessoas saem de casa dos pais para viver sozinhos, com amigos ou colegas e já não apenas para casar. As configurações são mais diversificadas hoje do que há vinte anos atrás. Isto é assim num determinado conjunto de pessoas, com um desenvolvimento tipico e sem diagnóstico de perturbação mental. Nestes últimos a situação é bem diferente e no caso do autistas adultos a situação é bem preocupante.


Ter habitação é um factor fundamental na saúde mental das pessoas. Pessoas com problemas nesta área estão em maior risco de desenvolverem problemas de saúde mental. A habitação de boa qualidade, acessível e segura é um componente vital na boa saúde mental, além de apoiar as pessoas com condições de saúde mental existentes.


Comparado com as pessoas com um desenvolvimento tópico, as pessoas com uma perturbação mental têm uma vez e meia mais hipóteses de morar em casas alugadas, maior probabilidade de ter instabilidade em relação aos contratos de arrendamento, duas vezes mais propensos do que aqueles sem problemas de saúde mental a ficarem insatisfeitos com sua moradia e quatro vezes mais probabilidade de dizer que piora a saúde.


A experiência de problemas de saúde mental é diferente para cada pessoa, e estes problemas de saúde mental podem ocorrer em qualquer momento de nossas vidas. Como consequência dessas diversas necessidades, as soluções de habitação para pessoas com problemas de saúde mental devem ser igualmente diversas. Isso requer levar em conta os diferentes tipos de suporte de que as pessoas precisam e como isso muda com o tempo. Uma pessoa com esquizofrenia não é semelhante a alguém com perturbação bipolar, etc.


No caso dos jovens adultos e adultos autistas que acompanho posso ter uma ideia daquilo que é a realidade expressa na investigação desta área. Apesar de haver um conjunto de pessoas no espectro do autismo que apresentam um determinado nível de funcionalidade e um perfil cognitivo médio ou superior que lhes permite frequentar o ensino obrigatório e terminar o ensino superior. As dificuldades na integração sócioprofissional continuam a ser muitas. Ou seja, temos pessoas autistas, jovens adultos formados e que apresentam diversas dificuldades de serem absorvidos no mercado de trabalho em boa parte porque este ainda não se encontra preparado para eles.


Esta situação vai levar a que os jovens adultos autistas passem a ter um maior nível de dependência dos pais e consequentemente maior dificuldade em saírem para autonomamente construírem a sua vida futura numa casa suportada por si. Este facto, tal como referido em tantas outras investigações em relação ao autismo e outras perturbações mostra que este acontecimento irá agravar o quadro clinico e ameaça o bem estar psicológico dos autistas adultos.


É fundamental que os autistas diagnosticados em qualquer etapa da sua vida mas pensando naqueles que o são em criança ou na adolescência e que beneficiam de uma intervenção adequada durante um período significativo das suas vidas. Possam chegar a este nova etapa e possam continuar a tomar decisões de forma autónoma e independente acerca do seu projecto de vida. Caso contrário estarmos a falar da promoção de saúde mental sem ter estas e outras questões asseguradas é uma falsa questão e que apenas adia o inevitável.


É imperativo que os autistas chegados aos 18 - 24 anos possam ter a possibilidade de se candidatarem a ofertas de emprego e possam ver validadas as suas candidaturas. Seja através da legislação existente (e.g., emprego apoiado) ou de outros mecanismos. Os próprios e as famílias mas também as escolas precisam de ter em mente este seu desenvolvimento. Perspectiva-lo atempadamente para que seja possível fazer um processo de transição verdadeiro e em respeito da condição de adulto da pessoa.

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