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Foto do escritorpedrorodrigues

Come on, Barbie, ...

Qualquer semelhança com a ficção, é pura realidade! A frase é ao contrário, mas neste mundo há muito coisa diferente!


Barbieland, 26 de julho de 2023, Cristina (nome fictício) descobre que é diferente! Na verdade não foi apenas agora que descobriu que é diferente. Agora recebeu um nome para aquilo que sempre sentiu ser uma realidade. E há muito que Cristina foi expulsa de Barbieland. Na verdade, nunca sentiu que pertencesse alguma vez a este sitio. Mas o facto de as pessoas não a compreenderem e aceitarem pela sua forma de ser fê-la desejar ainda com mais força não querer ali pertencer. Mas no caso da Cristina, o seu filme não acabou o fim de duas horas e quarenta. Na verdade, a longa metragem que representa a vida da Cristina já vai em trinta e nove anos.


E nestes anos todos Cristina foi representando vários papeis que na verdade nem sabia muito bem o porquê dos mesmos. E em outros momentos achou que essa representação a levaria a se encontrar, facto que nunca aconteceu. E ao fim de cada excerto de filme Cristina descobria da pior maneira que algumas daquelas personagens estavam lá para a magoar, usar ou gozar. Várias vezes Cristina fez o papel de vilã. Não que ela quisesse ser a má da fita, mas os directores insistiam que esse era o papel que melhor se encaixava consigo. E ao fim de muito tempo a própria Cristina passou a fazer esse papel no dia a dia. Até porque percebeu que nesse papel era boa. E assim nunca tinha as expectativas furadas relativamente aos outros. Eles não gostavam e a Cristina estava bem com isso, ou pelo menos aparentemente bem com isso.


Em Barbieland, uma percentagem significativa das cidadãs não pode ser autista. Isso é uma coisa para os cidadãos, os denominados Ken's. Na Barbieland, como em muitos outros lugares, os cidadãos e cidadãs foram sendo criados de acordo com uma determinada visão. De quem é esta visão, não se sabe! Dizem que é a visão da Sociedade. Mas se assim fosse não deveria ser mais plural? Quanto ao facto da Cristina gostar muito intensamente de cor de rosa é uma coincidência em relação à ficção. O rosa para Cristina representa uma coisa confortável. A vida para si é vista frequentemente através das cores e padrões. E dependendo da cor, tonalidade e padrões, os gostos e não gostos vão variando. Curiosamente, a Cristina aprendeu muito da vida com as barbies. Talvez não tudo e talvez não algumas coisas fundamentais, mas aprendeu muito. Apesar de Cristina as chamar de bonecas e não de barbies. Até porque nunca percebeu a ideia das bonecas se chamarem de nomes de pessoas quando são bonecas e muito menos o facto de serem bonecas diferentes e todas terem o mesmo nome de Barbie. Quer uma coisa ou outra nunca lhe fez sentido e então continuou a chama-las de bonecas.


Cristina teve uma amiga. Assim como a Barbie o Ken, tal qual era Cristina e a sua amiga. Inclusive até vieram a ter uma relação amorosa algures no final da adolescência quando a Cristina estava a começar a descobrir um pouco mais sobre a sua sexualidade. A relação amorosa não continuou, mas a relação de amizade sim. Até porque para Cristina as coisas não se confundem. Mas quando eram crianças, esta sua amiga deixa que Cristina se chamasse a Barbie de boneca, ainda que em troca dissesse à Cristina que era a amiga que inventava as brincadeiras. Para Cristina isso era o paraíso, até porque a sua imaginação não era assim tão variada quanto a da sua amiga. E foi assim que Cristina aprendeu muita coisa sobre a vida com as barbies e as bonecas. A sua amiga inventava todo um conjunto de mundos reais ou aproximados em que havia uma intrincada teia de personagens e acontecimentos.


No mundo das barbies nunca se falou de autismo. Mas já se falou de modelos de beleza feminina ou de restrição alimentar e anorexia. E Cristina conhece bem qualquer um deles. Até porque ao longo de vários anos foi tendo várias questões de restrição alimentar. E em determinada altura chegou a ser levada ao hospital por perda acentuada de peso. Ainda lhe disseram que poderia ser anorexia e que teria de vir a ficar internada. A Cristina mudou de um dia para o outro. Ficaram todos perplexos, ainda que isso para Cristina fizesse todo o sentido. Além do mais a ideia de ficar internada num hospital que não é a sua casa e que não fazia ideia do que iria acontecer no quotidiano assustava de terror. Seria sempre mais fácil fazer ela a mudança do que ir para um lugar onde a incerteza fosse uma constante.


Chegou a ter uma coleção de barbies, nunca tiradas das caixas, excepto a sua boneca (barbies) e que foi a primeira a ser oferecida e nessa altura ainda não tinha começado a vontade intensa de fazer coleções. Mas foi difícil manter a coleção intacta de barbies por tirar das caixas. As suas primas cada vez que lá iam a casa tentavam assaltar-lhe o quarto. Ao ponto de a Cristina ter colocado um balde no cimo da porta entreaberta. O problema foi que colocou dentro do balde a cola industrial que o seu pai tinha na garagem. Escusado será dizer que as suas primas nunca mais quiseram ouvir falar da Cristina. Nem a sua tia alguma vez mais quis falar com os pais da Cristina. Sendo que isto para si não representava nenhum problema. Mesmo que os pais nunca tivessem compreendido o porquê daquela situação.


A vida da Cristina daria um filme. É bem verdade. Tal como a vida de qualquer um de nós, seja com mais ou menos situações. Mas a Cristina nunca quis fazer parte deste filme, elenco ou guião. Mas agora que Cristina começa a saber um pouco melhor sobre a sua real personagem talvez possa escolher fazer outros filmes.


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