Quantas vezes já ouviu dizer - "Tens de sair do armário."? ou "É muito importante para ti e todos os outros que saias do armário!"? Mas já perguntaram às pessoas se elas já alguma vez construíram um armário? E se sabem do que se trata? E quais as implicações? Ou de quais os cuidados a ter? Pois bem, iremos falar não de carpintaria mas sim da questão das pessoas se identificarem como autistas e em contextos diferentes, como por exemplo no trabalho. São muitos os adultos e com um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo que me coloca directamente essa questão - Devo ou não dizer no meu local de trabalho que tenho este diagnóstico? Quando fazemos uma pergunta normalmente já temos uma resposta formulada no pensamento. E muitas das vezes a resposta da pessoa é
"- Não, não quero dizer nada no meu trabalho!". Numa altura em que se fala mais sobre o autismo e neste ao longo da vida. Os movimento pró-Autismo são cada vez mais e mais influentes. Conhecemos mais pessoas com esta condição. Existe inclusive medidas de protecção e promoção do emprego inclusivo. Então porquê continuar a haver este receio?
Muito do que ouvimos e lemos sobre o que vai sendo desenvolvido no âmbito do Autismo ocorre a nível global. E nem sempre este mesmo tipo de trabalho é desenvolvido no nosso pais. Ou seja, apesar de haver um cada vez maior crescimento dos movimentos de auto-representação pró-Autismo. E que estes têm cada vez mais uma maior influência na criação de políticas públicas para a protecção e promoção da Comunidade Autista. Veja-se por exemplo, as boas práticas existentes em Espanha (Confederación Autismo Espana) ou no Reino Unido (National Autistic Society). E ainda no caso de Espanha e mais especificamente no âmbito da empregabilidade da pessoa com Perturbação do Espectro do Autismo verifica-se uma maior dinâmica nesta área (ver aqui exemplo).
Não é apenas lá fora que existe algum tipo de projecto a este nível. Cá dentro, a APSA, a Federação Portuguesa de Autismo, o PIN e outras Instituições que trabalham directamente com este grupo - jovens e adultos com Perturbação do Espectro do Autismo, vão desenvolvendo estratégias importantes para promover a empregabilidade e integração sócio-profissional das pessoas nesta condição. Mas a sensação é a de que parece continuar a haver a falta de uma estratégia global e que ajude a dar uma resposta à pergunta inicial - Devo ou não dizer no meu local de trabalho que tenho este diagnóstico?
Ou seja, nestas Instituições e nas empresas com quem trabalham directamente e em parceria para ajudar no processo de integração socioprofissional das pessoas com PEA, existe todo um trabalho de sensibilização e que promove que as pessoas possam saber que o candidato tem um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo. No entanto, são muitas as pessoas que não estão a ser ajudadas neste processo. Ou porque as empresas sensibilizadas ainda não são em número suficiente para dar uma resposta às necessidades de tantos pedidos. Ou porque as pessoas adultas com Perturbação do Espectro do Autismo gostariam simplesmente de não serem discriminadas pelo facto de terem este diagnóstico. E poderem fazer a sua candidatura sem terem necessariamente de contar com a parceria destas instituições. E serem avaliados em condições de igualdade face aos outros candidatos.
E são muitas as pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo que estando a trabalhar não querem dizer o seu diagnóstico. Ainda que muitas delas sintam que poderiam beneficiar de ajustes no local de trabalho ou no processo. Por exemplo, poderem usar fones para se poderem proteger do ruído devido à sua hipersensibilidade auditiva. Ou estarem num local protegido por uma parede para que não se sintam expostos à passagem constante dos colegas. Ou ainda que sejam constantemente avaliados negativamente na sua avaliação de desempenho porque têm determinadas características na interacção social, relações interpessoais e comunicação que tem a ver com a sua identidade. Mas que em contraposição têm um conjunto de outras características por vezes acima da média e que não estão a ser aproveitadas ou valorizadas.
Fazer adaptações nos locais de trabalho e nos processos não representam um acréscimo de gastos. E na quase totalidade das situações são adaptações que beneficiam todos os colaboradores e não apenas alguns. Além de poderem criar melhores condições de trabalho e que estão intimamente ligadas com um maior bem estar dos colaborares e com melhores índices de produtividade. Basta ver as empresas em que existe esta cultura organizacional implementada e os seus resultados anuais a crescerem. Para além do bem estar sentido pelos colaborares.
Ainda há muito para fazer para que as pessoas possa sair do armário. Nomeadamente, ajuda-las a se conhecerem, mais e melhor. Pois assim estarão em condições de se fazerem auto-representar, mais e melhor. Para sair do armário é preciso haver garantais de protecção de que as pessoas não serão prejudicadas. Para tal, não basta apenas mostrar-lhe a porta ou então dar-lhe madeira, pregos e um martelo e deixar o resto por sua conta. É importante, haver a construção de uma política global. E apesar de já existirem directivas comunitárias e legislação nacional, nomeadamente com a implementação de cotas. Continua a haver muitas destas pessoas que ficam de fora dos apoios e que são um Capital Humano fundamental.
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