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Brinquedos para adultos

Não, não é nada daquilo que alguns de vocês possam estar a pensar! Não vou falar de brinquedos sexuais. Mas também não vou falar de adultos que gostam de brincar com determinados brinquedos dentro do que são os seus interesses especiais.


Da mesma forma que ainda se vai pensando que o autismo é um condição (quase) exclusiva de crianças. Também parece ser verdade que muitas pessoas pensam que as pessoas autistas adultas não têm ou deixaram de ter algumas das suas características relacionadas com o processamento sensorial.


Para além das questões relacionadas com a interação e comunicação social, assim como o padrão de comportamentos e interesses restritos e repetitivos. Um outro aspecto presente na vida das pessoas autistas são as questões sensoriais, seja a hipo (i.e., abaixo da sensibilidade normativa) ou a hipersensibilidade (i.e., uma sensibilidade aumentada, aguda, excessiva). E estas podem estar presentes em situações relacionadas com o som, cheiro, luz, toque ou paladar. Para além de se verificar com bastante frequência sensações de uma imersão sensorial global.


Muitos de vocês com filhos autistas terão inúmeros relatos de situações comportamentais mais complexas relacionadas por exemplo com a comida. Seja devido ao cheiro, textura ou sabor de determinado alimento, muitas crianças autistas fazem rejeição de determinados alimentos. Ou então, escolhem de uma forma exclusiva determinados alimentos precisamente pelo facto de lhes ser agradável ao cheiro, sabor ou textura. E o mesmo pode acontecer com as roupas. Certas texturas são causadoras de maior aversão ao toque. E desde cedo vestir umas calças de ganga, uma camisa ou uns collants, pode ser uma tarefa sentida como impossível e causadora de grande mal estar na criança. Os exemplos são vários e cada pessoa autista pode fazer um verdadeiro inventário de tantas outras situações.


Mas a questão do processamento sensorial não se prende exclusivamente com as questões aversivas e causadoras de mal estar. Também se verifica que o contacto com determinados materiais e objectos parece ser causador de um certo bem estar. Nunca saio de casa sem o recorte de tecido que levo no bolso das calças para ir tocando ao longo do dia, diz Rui (nome fictício).


Nas crianças autistas é frequente verificarmos que as questões relacionadas com o processamento sensorial estão frequentemente relacionadas com os episódios de desregulação emocional e comportamental. E nestas situações têm sido usados determinado conjunto de materiais e objectos (brinquedos) que são usados para ajudar a criança a melhor se auto-regular.

Mas na verdade, o processamento sensorial não se prende unicamente com as situações de aversão e/ou aproximação a determinadas estímulos sensoriais. Ainda que possa ser compreensível que muitos de nós nos centremos nesses aspectos. Até pela visibilidade e impacto que isso têm na vida da pessoa. No entanto, quando trabalhamos com pessoas autistas, o desenvolvimento da nossa actividade em equipas multidisciplinares é fundamental. E nesta área especifica do processamento sensorial, poder contar com a expertise dos Terapeutas Ocupacionais é fundamental. Até porque esta questão do processamento sensorial prende-se com uma função neurofisiológica fundamental e responsável por registrar, organizar e interpretar as informações sensoriais captadas pelos sistemas sensoriais. E se pensarmos nas crianças pequenas, o inicio da sua vida e a forma como vão apreendendo as experiências de vida e organizadoras da sua experiência do mundo, passa fundamentalmente pelo processamento sensorial. Ele põem tudo o que apanha a jeito na boca! Quantos não ouviram já esta frase em pais com crianças pequenas? E como tal, é importante podermos presente ferramentas conceptuais e metodológicas para podermos trabalhar com o processamento sensorial. Como tal, a integração sensorial será possível de ser definida como a relação entre o processamento sensorial, comportamento, aprendizagem e desenvolvimento. E desta maneira, para a pessoa se apropriar do ambiente, estabelecer relações funcionais e aprender, isso vai depender da percepção, organização, interpretação e integração das informações sensorial.


Em caso de dúvida não hesitem em contactar a Mafalda Correia, que além de ser a especialista na área, é com quem comecei a aprender sobre estes aspectos fundamentais do processamento sensorial.


Mas voltando à questão dos brinquedos para adultos. Já tinha referido que é habitual pensarmos que nas pessoas autistas adultas as questões sensoriais são inexistentes ou deixaram de existir. No entanto, se perguntarem a qualquer pessoa autista adulta arriscam-se rapidamente a perceber que isso não corresponde de todo à verdade. E como em muitas outras situações relacionadas com as relações sociais, as pessoas autistas adultas vão aprendendo ao longo da vida a desenvolver estratégias comportamentais e cognitivas para colmatar algumas das suas dificuldades. E tal como as pessoas autistas adultas, principalmente as mulheres, desenvolvem comportamentos de camuflagem social. Também no processamento sensorial, as pessoas autistas adultas desenvolvem estratégias para camuflar algumas das suas dificuldades e necessidades sensoriais. E conseguem de uma melhor forma terem comportamentos mais discretos comparativamente ao período em que eram crianças.


Contudo, apesar de todas as competências que as pessoas autistas adultas possam ter desenvolvido e continuar a desenvolver. São ainda muitas as situações em que se vêm imersos em situações de grande intensidade de estímulos sensoriais. Sejam quando necessitam de se deslocar a uma grande superfície para fazerem as suas compras, ou então no seu próprio local de trabalho, passando pelos transportes públicos. O planeta está sobrecarregado de estímulos dos mais variados tipos. E a situação das pessoas autistas adultas torna-se muito frequentemente insustentável. Para além de pensarmos que as situações referentes à alimentação continuam a existir numa boa parte das vezes.


Contudo, quando as pessoas autistas adultas procuram algum tipo de objectos (brinquedos) para os conseguir ajudar a lidar com estas e outras situações, verificam que há uma menor gama de oferta. É verdade que a oferta presenta na internet é variada. Mas nem sempre a mais indicada para a situação especifica da pessoa. Até porque a investigação na área do processamento e integração sensorial nas pessoas autistas adultas, ainda se encontra muito no seu inicio. E como tal, as próprias respostas que são produzidas ainda derivam muito da experiência das próprias pessoas autistas e dos profissionais, mais especificamente Terapeutas Ocupacionais que trabalham com esta população.


Será fundamental poder haver uma maior dedicação ao processamento e integração sensorial nas pessoas autistas adultas. Até porque os estudos científicos continuam a referir que as situações de meltdown e desregulação comportamental e emocional nas pessoas autistas adultas, continuam em muitos relacionadas com os episódios de imersão sensorial.





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