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Balanços desafiantes

Alguns dirão que a altura da corda face ao nível do chão é baixa e como tal o exercício em si não é difícil. As pessoas dizem muitas coisas, várias vezes por desconhecimento, ou por nunca terem experimentado a situação.


O mesmo acontece com os aspectos relacionados com as variações hormonais nas mulheres. E ainda mais quando falamos de mulheres autistas. Seja a menarca (i.e., surgimento do primeiro ciclo menstrual), síndrome pré-menstrual, puberdade, gravidez, perimenopausa e a menopausa podem ser controversas e complexas. Volto a sublinhar que a controvérsia e complexidade é superior quando falamos de mulheres autistas.



" Eu tinha tanta coisa a acontecer na minha vida, e tudo aquilo encaminhava-se para um burnout autista e eu nem sequer estava a compreender. Tenho vários problemas de saúde crónicas que se estavam a manifestar ao mesmo tempo na minha vida e a perimenopausa deu-lhes um grande impulso. . . Muitas vezes não me apercebo do que está a acontecer até

que algo até algo ser bastante grave. . . "


Carolina (nome fictício), mulher autista de 49 anos


Por exemplo, embora seja prematuro concluir se as pessoas autistas experimentam diferenças fisiológicas e psicológicas significativas na menopausa em comparação com as mulheres não autistas. Ainda assim parece claro que algumas pessoas autistas experimentam uma confluência extrema e esmagadora de sintomas e dificuldades na menopausa que podem agravar o sofrimento físico e mental existente.


É fundamental chamar a atenção dos clínicos e investigadores para a procurar de uma melhor compreensão sobre estes aspectos. Estamos a uma distância tão visível de compreendermos estes aspectos, comparáveis com aquilo que aconteceu na compreensão destas mesmas questões nas mulheres no século passado. A questão é que estamos no século 21 e continuamos com graves falhas de compreensão e que trazem um impacto e sofrimento tão marcado a quem já sente mal estar por tantas outras situações de vida.


Tudo é intenso no autismo. É como ter um amplificador dentro da pessoa. Todas as experiências, sensações, multiplicidades de acontecimentos dentro do corpo estão amplificados, intensificados.


As experiências sociais anteriores e traumas anteriores têm um efeito profundo nos comportamentos e expectativas das raparigas e mulheres autistas. Estas experiências conduzem a autoconsciência, autocrítica e autocensura em vários contextos sociais e de vida. Para muitos destas raparigas e mulheres, a sua vida é pautada de décadas de incompreensão, episódios de esgotamento e sobrecarga, isolamento social, bullying e vitimização culminaram na menopausa, quando se tornaram tão stressadas e traumatizadas que já não eram capazes de lidar com a situação. Vários mulheres descrevem um esforço ao longo da vida para camuflar, para se enquadrarem melhor social ou profissionalmente; sentiram este esforço como exaustivo, e algumas descreveram-no como um factor que contribuiu para a sua falta de saúde, e agravamento de aspectos da saúde.


"Penso que a nossa sociedade não fala, não aborda, não compreende as mulheres da nossa idade, em geral, muito bem. E então quando se tem a dimensão adicional do autismo. Não há nenhum recurso, não há nenhuma fonte de conhecimento para me dizer como lidar com isso. E também não há espaço na sociedade para isso. Porque nós não falamos sobre a menopausa, muito menos sobre a menopausa autista."


Rute (nome fictício), mulher autista de 53 anos


As transformações e variações hormonais que vão ocorrendo no corpo da mulher autista, não são apenas alterações hormonais verificadas em análises médicas, ainda que seja fundamental que o façam. Aqui neste ponto reforço a importância fundamental do trabalhar junto de uma equipa médica e com conhecimento sobre as perturbações do neurodesenvolvimento na pessoa adulta. Mas estas alterações também correspondem a transformações e variações comportamentais, emocionais e experienciais. O corpo não encerra estas mudanças. O corpo e todas estas transformações hormonais leva a que a mulher autista tenha uma vivência ainda mais única em boa parte das suas experiências de vida, sejam aquelas mais quotidianas, mas também as de transição.


Os aspectos do sentir destas variações hormonais implica de forma significativa nas relações interpessoais, sociais e amorosas. Mas também no descobrir e redescobrir do seu corpo. E até mesmo dos próprios comportamentos de higiene. Os aspectos da sexualidade na mulher autista parece estar garantidamente influenciados por todas estas alterações e amplificações. E isso também se traduz numa melhor ou pior qualidade de vida. A maternidade e todo o processo pré e pós parto, mas também a relação com os seus filhos e companheiro/a, são todas elas situações que estão debaixo destas influencias hormonais.


Como tal, podermos compreender as mudanças hormonais na mulher autista, não passa somente por um conhecimento cientifico e clinico, que garantidamente necessita de ser melhorado. Mas também passa e com igual importância da compreensão da própria mulher, seja este ao nível do auto-conhecimento, mas também do conhecimento que os clínicos necessitam de ter para fazer este caminho de forma conjunta na terapia.


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