Já ouvi falar do diagnóstico Voldermort? Ainda não? Sorte a sua! Mas eu vou falar-lhe um pouco dele. E ainda que seja um nome que ninguém, ou muitos poucos, se atrevem a dizer, eu vou arriscar. E não estou preocupado com o facto de ir fazer spoiler. Ela há coisas que mais vale saber antes, garanto-vos.
Ora então, o diagnóstico Voldermort também é conhecido por Perturbação da Personalidade Borderline. Afinal já conhece? A sério? E se eu disser que esta perturbação é em crianças ou jovens? Já compreende agora a escolha do nome Voldermort?
Um diagnóstico em saúde mental é por vezes visto como algo que pode ameaçar a identidade dos jovens ou o sentido de si mesmo, e os profissionais dentro da saúde mental infantil nem sempre concordam na utilização destes diagnóstico na sua prática clinica.
Mais recentemente, tem sido apresentado resultados de investigação de que um primeiro diagnóstico de Perturbação da Personalidade em crianças em jovens pode levar à estigmatização e evitamento dos cuidados de saúde, com efeitos adversos na adolescência. O desejo de proteger os jovens do estigma será provavelmente a principal razão pela qual os clínicos a nível mundial se continuam a abster de diagnosticar uma Perturbação da personalidade em crianças e jovens.
Há clínicos que salientam que o conceito de Perturbação da Personalidade é tão fiável e válido na adolescência como em adultos e demonstram estabilidade comparável em diferentes idades. E também passou a haver um maior interesse entre clínicos de enquadramentos e explicações alternativas para as situações de instabilidade no humor e que poderia ser visto como as interferências de um diagnóstico de Perturbação da Personalidade Borderline, por exemplo. Ou então, também há quem refira que a alternativa mais recente apresentada na ICD-11 do diagnóstico de PTSD complexo, ainda que seja útil, não considera de forma adequada os comportamentos ou experiências internalizadas que parecem ser melhor explicadas pelas Perturbações da Personalidade, e que além disso, estas duas condições impossíveis de coexistência.
E além disso, já vai sendo tempo e de uma forma universal de concordar que os problemas de personalidade não se fazem apenas notar aos 18 anos, mas numa idade muito mais precoce. No entanto, ainda estamos longe de uma maior concordância de que a Perturbação de Personalidade pode ser identificada mais cedo, e o limite de idade colocado de forma arbitrária para o diagnóstico foi os 18.
Seja porque há uma ausência de conhecimento e que ajude a explicar o perfil de funcionamento da criança e jovem, e muitas vezes a opinião do expert sobrepõem-se à racionalidade. Ou então, o receio do estigma acaba por prevalecer. O certo, é que muitas crianças e jovens acabam por ser privadas de uma intervenção adequada. E que muitas das vezes são situações que sabendo nós que estão melhor enquadradas e explicadas pelas Perturbações da Personalidade, tenderão a persistir no tempo, e neste caso principalmente por ausência de uma resposta clínica capaz.
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