Eu sabia que tinha de o fazer porque queria ser uma boa mãe. Nunca tinha sido mãe, e nunca tinha sentido ser boa a fazer qualquer outra coisa. Mas o ser mãe foi a única coisa que alguma vez desejei ser na vida, e por isso não queria falhar! diz Carolina (nome fictício), mulher e mãe autista com 27 anos.
Ao falarmos ou ouvirmos sobre a amamentação temos a ideia de se tratar de algo grandioso, até mesmo sagrado. Não é apenas alimentar o filho recém nascido. É muito mais do que isso. É um fortalecimento dele do ponto de vista da saúde física e do seu sistema imunitário. Mas também de um fortalecimento de si enquanto pessoa em construção e crescimento na relação. Além de ser um fortalecimento e consolidação da relação de vinculação com a figura materna. E será certamente também algo vital para a identidade daquela mesma mulher.
Falar de amamentação e dizermos que não faz sentido que a mulher amamente a sua criança mostrando o seu peito. Ou dizer que as crianças não deviam ser amamentadas a partir de determinada altura no desenvolvimento. Seja quem for, homem ou mulher, certamente que não vai ser uma conversa pacifica e consensual. E certamente alguns dos ânimos irão se exaltar. E se ouvirmos uma mulher que já amamentou dizer que foi uma das experiências mais difíceis e até mesmo horrível, acredito que saibam que vão haver olhares e pensamentos com um julgamento nada positivo acerca da sua pessoa.
O que dizer de falarmos de amamentação em mulheres autistas, quando temos um número tão grande de pessoas que pensam que este é um diagnóstico apenas de crianças. E outros tantos que pensam que as pessoas autistas não têm ou desejam ter relação e muito menos românticas ou até de serem pais! Mas há muitas mulheres autistas e que escolhem e querem ser mães. E como tal é imperativo podermos falar sobre a amamentação enquanto parte fundamental deste processo.
Era simplesmente impossível para ele pegar. O que acabou por resultar foi o protector de mamilo que usei durante o primeiro ano. Nesse ano, não dormia muito, por isso era como se estivesse a fazer e a limpeza constante da proteção da tetina. Eu tinha vários, mas ao mesmo tempo, é preciso de o higienizar e tudo. Quando acabamos de dar de mamar, ainda não acabámos. É preciso higienizar, é preciso lavar. O meu sono nunca tinha sido bom. Mas nos últimos quatro anos, depois de ter sido diagnosticada com Perturbação do Espectro do Autismo e ter iniciado terapia e acompanhamento psiquiátrico o meu sono melhorou significativamente. Foi muito difícil voltar à situação de privação de sono de uma forma forçada! diz Telma (nome fictício) mulher e mãe autista com 32 anos.
Como o meu estágio enquanto psicólogo clínico foi realizado em contexto hospitalar num serviço de pedopsiquiatria, tive a oportunidade de realizar bastante trabalho com a psiquiatria de ligação no serviço de obstetrícia. E isso levou-me a contactar com várias mulheres que tinham acabado de ter um parto e que estavam a começar a amamentar as suas crianças. Umas já tinham sido mães outras vezes, enquanto outras o estavam a ser pela primeira vez. E na altura nem sequer me passava pela cabeça esta questão do amamentar em mulheres autistas. Isto já vai há vinte e cinco anos atrás. Mas frases como "Não tive uma única mamada que não parecesse um ralador de queijo a arrancar-me os mamilos. Nem uma única vez”, marcou-me na minha experiência enquanto profissional de saúde na tentativa de compreender a amamentação para lá do que tinha aprendido e ouvido até então
A Organização Mundial de Saúde recomenda que as crianças sejam amamentadas exclusivamente nos primeiros seis meses de vida e, em seguida, a introdução da alimentação complementar saudável, adequada e segura, mantendo a amamentação até aos dois anos de idade ou mais.
Tem sido encontrado/reportado que as crianças autistas são amamentadas durante um período menor de tempo comparativamente a crianças não autistas. E que um número considerável de crianças autistas não passa dos 6 meses de idade no que diz respeito à amamentação. E é necessário compreender quais as razões que se prendem com a criança, mas também com a mãe, e ainda mais quando esta também é autista.
Tenho três filhos e o mais novo tem um diagnóstico de autismo. Os outros dois não têm nada. Por isso sei o que é amamentar duas crianças não autistas e comparar com as dificuldades que senti com este meu filho mais novo. Foi muito difícil para mim sentir que aquele momento com ele parecia estar sozinha, até pela forma menos envolvida dele! Para além disso a pega no mamilo era sempre descoordenada e vigorosa. E teve imensos episódios de engasgamento. Foi um terror, refere Rute (nome fictício) mulher e mãe autista de 45 anos.
Se as mães procuram informar-se sobre o processo de gravidez e amamentação entre outros. As mães autistas são provavelmente de serem ainda mais capazes de aprofundarem essa pesquisa. Até porque já o fazem para muitos daquilo que são os seus interesses mais restritos e outros hiperfocos. Contudo, como em muitas outras situações, não é o facto de estarem munidas de toda aquela informação que facilita o processo. Por vezes pode até mesmo causar o contrário. E ainda mais no processo de amamentação em que é preciso dar uma resposta mais imediata no momento. Seja no facilitar a pega do mamilo por parte da criança, poder continuar a agarrar adequadamente na criança e toca-lo ou embala-lo de forma a facilitar o processo de amamentação, não deixar de continuar a interagir com ele, seja através do olhar ou do diálogo, etc.
Ele perdia rapidamente o interesse, mesmo que tivesse fome. Eu sei que parece estranho, mas era mais ou menos isso que acontecia, e eu não sabia dizer se era porque ele não estava a receber o que precisava ou se estava realmente... Acho que a sério, ele estava a perder o interesse não porque não tivesse fome ou por não conseguir perceber, mas simplesmente perdia interesse e ficava a olhar para longe! menciona Carla (nome ficticio) mulher e mãe autista de 32 anos.
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